terça-feira, 16 de junho de 2009

Das Infrações Penais no Código de Defesa do Consumidor

O Direito, de acordo com o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra O Direito Penal do Consumidor (p.1), por não estar preparado para regrar as relações de produção e consumo de massa, dava ao consumidor um mero esboço de proteção contra abusos praticados no mercado. Aduz ainda o douto Ministro e mestre que:

Em decorrência da inadequação, particularmente do direito civil, ao consumidor que desejasse se proteger das condutas dos fornecedores restava, frequentemente, apenas o recurso ao direito penal tradicional, igualmente moldado para reger as relações pessoais e não relações de massa.

Não que as normas penais, per se, conferissem ao consumidor as respostas esperadas, especialmente ao nível de ressarcimento. Mas pelo menos serviam como resposta social – já que este é o valor real da sanção penal – aos comportamentos ilícitos praticados no mercado e, não poucas vezes, funcionava como instrumento de pressão para a solução do conflito no plano privado.

É de suma importância ressaltar que o direito penal, comum ou especial – antes mesmo do surgimento consumerista – já oferecia meios para a proteção do consumidor, tal como se observa no Código Penal de 1940: no âmbito das fraudes, a fraude no comércio (art. 175); quanto à tutela da “saúde pública” com os crimes, entre outros, de alteração de substância alimentícia (art. 273), emprego de processo proibido ou substância não permitida (art. 274), invólucro ou recipiente com falsa indicação (art. 275), substância avariada (art. 279)[1], medicamento em desacordo com receita médica (art. 280), bem como, a Lei nº. 1.521/51 que trata da proteção a economia popular.

Conforme ressalta o douto Ministro, estes casos não resguardavam adequadamente o direito do consumidor, em face de que o direito penal não reconhecia sequer a existência do consumidor, desta forma, não enxergava o consumidor com identidade própria, perdendo, assim, de vista a relação de consumo como objeto jurídico autônomo, supraindividual e imateral. Desta forma, limitava a atuação do direito penal a atuação à vida, patrimônio e à liberdade dos indivíduos.

Por isso, durante a produção do Código de Defesa do Consumidor nasceu a
o plano privado.esso e, er sire preocupação do legislador mediante com a criminalização de comportamentos reputados graves ora relatados na parte material, visando dessarte garantir o seu efetivo cumprimento, bem como, não prejudicar a legislação penal que possuiam efetiva consonância com a exigência social, ressaltando-se os tipos elencados no Título II – Das Infrações Penais.

Assim, além dos âmbitos administrativos e civil de defesa do consumidor, assume relevante papel nas diretrizes traçadas pelo Código Brasileiro de Defesa do Consumidor sua tutela no âmito penal até como forma de assegurar-se a efetividade das demais normas insertas no referido Código.

Vale aqui relembrar o pensamento de Othon Sidou no sentido de que seria na prática impossível preverem-se todos os fatos que prejudicam ou então venham a prejudicar os consumidores, normalmente em se tratando de fraudes contra eles cometidas e outros comportamentos lesivos. (FILOMENO apud OTHON SIDOU, 2004, p.648)

Desta forma, iremos elencar neste capítulo unicamente os crimes previstos no Código de Defesa do Consumidor, quais sejão: crimes omissivos (arts. 63 e 64); crime quanto a execução de serviços perigosos (art. 65); crimes de publicidade (arts. 66 à 69); crimes de falta de autorização (art. 70); crime de cobrança vexatória (art. 71); crime de acesso e omissão na correção de dados (arts. 72 e 73); e crime de falta de garantia (art. 74).


1 CRIMES OMISSIVOS

Na óptica do Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (pág.2) pode-se classificar os crimes omissivos como sendo crimes relacionados a informação do consumidor, ao passo que decorrem dos riscos de acidentes de consumo que produtos e serviços podem provocar.

Apresenta-se disposto na Lei nº. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor – como crimes omissivos ou relacionados a informação do consumidor [2]como sendo:
Art. 63. Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade:
Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa.
§ 1° Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser prestado.
§ 2° Se o crime é culposo:
Pena Detenção de um a seis meses ou multa.
Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado:
Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa.
Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo.

Pode-se assim apreender que o legislador pátrio ao tipificar os crimes omissivos vieram salvaguardar os direitos básicos do consumidor expostos no artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor.
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Grifo nosso).

Deve-se destacar que devido a estrutura bem-definida e harmônica do CDC, entrelaça-se tal dispositivo com o artigo 9º da Lei do Consumidor. É de salientado devido ao artigo rezar o seguinte:
Art. 9° O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto.

Neste mesmo raciocínio o douto Luc Bihl, quanto à informação como direito básico do consumidor, aduz o seguinte: “só um consumidor completamente informado pode contratar, em pleno conhecimento de causa, com os fornecedores e desempenhar o papel que deve ser seu, o de parceiro econômico” (LUC BIHL apud BENJAMIN, Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor, p.3).

É de fácil constatação tamanha relevância ao passo que nada adiantaria norma indicando preceito regulador, sem a devida penalidade. Bem como, vale relembrar o ensinamento do professor José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.690) no comentário ao Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto que: “o comportamento delituoso é claramente definido pelo verbo omitir, e consiste no fato de alguém deixar de alertar o consumidor quanto aos riscos por ventura oferecidos”.

Isto decorre, de acordo com o que se pode extrair da obra do Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.3), que em face da revolução efetuada pela tutela civil do consumidor concomitantemente com o direito penal do consumidor, propiciou-se que, em vez de punir apenas comportamentos positivos – ativos – do fornecedor, as abstenções produziram um dever afirmativo de informar.

Em face desta disposição, apresenta-se como importante esclarecimento que:
A garantia de informação plena do consumidor – tanto no seu aspecto sanitário quanto no econômico – funciona em duas vias. Primeiro, o direito do consumidor busca assegurar que certas informações negativas (a ‘má informação’, porque inexata – digo algo que não é – como na publicidade enganosa) não sejam utilizadas. Em segundo lugar, procura garantir que certas informações positivas (deixo de dizer algo que é, como, por exemplo, alertar sobre riscos do produto ou serviço) sejam efetivamente passadas ao consumidor.

O descumprimento da obrigação de não veicular informações negativas materializa-se, normalmente, através de condutas comissivas. Já a não observância da obrigação positiva de informar molda-se, comumente, em tipos omissivos. (BENJAMIN, Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor, p.4).

Desta forma, completa-se com a legislação observando a falta de informação por parte do fornecedor, incorrendo no crime ora destacado. Devendo assim, relatar que a qualquer momento do conhecimento do defeito – antes de colocar em circulação ou depois – pratica do crime relacionado à informação.


1.1. Crimes omissivos e a forma culposa

É de suma importância destacar que os crimes omissivos são formais, pois decorrem da relação entre a ação e o resultado, mas consuma-se só com a ação; e de mera conduta, pois decorre da prática do ato ora tutelado e consumando-se com a prática deste.

Conforme ressalta o parágrafo segundo do artigo 63 cabe-se conduta culposa, porém não se admite a tentativa por ser um crime formal. Assim, a culpa consiste da negligência, ao passo que o dever de alertar contra os riscos não o faz com a devida presteza, ou não procede como determina o dispositivo legal.

Pode-se então observar que, conforme José Geraldo Brito Filomeno, tal dispositivo que regulamenta sobre a forma culposa tem sua importância ao passo que, visa proteger efetivamente o consumidor com a devida advertência para o risco presente em cada produto ou serviço, ensejando assim, nas devidas precauções pelos consumidores quando aos possíveis danos à sua integridade corporal e saúde.


1.2. Omissão na comunicação às autoridades competentes

A finalidade de imputar penas detentivas e pecuniárias a todos que não comunicar às autoridades competentes, conforme o artigo 64 do Código de Defesa do Consumidor, é conduzir o fabricante à produção de um produto com uma qualidade melhor, pois com isso evita gastos com o recall[3].

Destaca-se o ensinamento de José Geraldo Brito Filomeno no Código do Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto (2004, p.692), in verbis:
(...) ao lado do dever de o fornecedor de não colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança, aqui se entendem aqueles que certamente apresentam grau de nocividade ou periculosidade além do que normalmente se esperaria (beyond expectation, no dizer da doutrina e jurisprudência anglo-americanas), mesmo porque ninguém certamente irá ignorar que muitos produtos já apresentam relativos graus de periculosidade e nocividade, mas dentro do que deles se espera (por exemplo, um medicamento com seu fator risco ou ‘efeito colateral’ das bulas, um veículo automotor etc.).

É de suma importância relembrar que o dever de informar é um princípio fundamental no Código de Defesa do Consumidor e consagra-se com o art. 6º, I e II. O ilustre professor Rizzatto Nunes, em sua obra Curso de Direito do Consumidor (2004, p.129), ainda destaca que além do dever de informar de forma clara e precisa, não se admite falhas na omissão.

Deve-se copilar a maestrina colocação que o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin aponta em sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (pág. 20) traz quanto a finalidade da tipificação da omissão na comunicação às autoridades competentes, in litteratim:

A conduta de ‘deixar de comunicar’ é mais formal e estrita que ‘deixar de alertar’ (art.63, §1º). A comunicação exigida aqui é muito mais que mero alerta. É atividade que o fornecedor desempenha como os olhos postos naqueles que são destinatários. Podem, conforme o caso, ser necessárias visitas pessoais, telegramas personalizados, sem prejuízos de anúncios multimídia.

A comunicação aos consumidores tem objetivo distinto daquele à autoridade competente. Lá, visa-se acautelar o consumidor, evitando, não raro, que chegue se quer a adquirir ou consumir o produto. Aqui, ao contrário, procura-se alertar o administrador para que, conhecendo os fatos, possa tomar outras medidas complementares, aplicar sanções administrativas e, se for o caso, determinar a retirada do mercado (recall), nos termos do art. 64, parágrafo único. (BENJAMIN, Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor, p.20).

Deve-se estabelecer, na mesma forma que o professor Rizzatto Nunes proclama, que os princípios da transparência e informação firmam a obrigação de o fornecedor dar a cabal informação sobre os produtos e serviços oferecidos e colocados no mercado.

Complementando o assunto; o professor José Geraldo Brito Filomeno destaca no código comentado que se pode presumir do art.10 do código supra-citado, há o dever de retirar o produto do mercado ou abster-se do oferecimento do serviço, dever esse implícito na letra do mencionado dispositivo. Assim, está devidamente disposto os §§ 1º, 2º e 3º do mencionado art.10 do CDC ao estabelecer:
§ 1° O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários.
§ 2° Os anúncios publicitários a que se refere o parágrafo anterior serão veiculados na imprensa, rádio e televisão, às expensas do fornecedor do produto ou serviço.
§ 3° Sempre que tiverem conhecimento de periculosidade de produtos ou serviços à saúde ou segurança dos consumidores, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão informá-los a respeito.

Pode-se extrair do texto legal que o legislador ao transcrever o assunto visando garantir o direito a informação relativa a produtos que venham apresentar algum problema após o seu lançamento. De tal modo que o professor José Geraldo Brito Filomeno relata:

No caso, fica evidenciado que o risco criado pelo produto deve ser minimizado: principalmente, pelo próprio responsável (aviso e recall) e, secundariamente, pelas autoridades competentes, incorrendo aquele nas penas de que trata o art.64 sob análise em caso de omissão de comunicação àquelas mesmas autoridades, ou então não retirando do mercado os produtos considerados perigosos ou nocivos, repita-se, além do que normalmente deles se espera.

Pode-se assim compendiar que o CDC exige uma dupla comunicação: aos consumidores e às autoridades. Isso porque seus objetivos são distintos, sendo imprescindíveis à proteção efetiva dos consumidores em relação aos acidentes de consumo. Logo, faltando uma das comunicações, o crime se consuma. Desta forma, na mesma óptica que José Geraldo Brito Filomeno apresenta (2004, p.694) pode-se concluir que o advento desta proteção decorre do entrelaçamento dos aspectos administrativos, civis e penais, que, ao estabelecer os direitos fundamentais do consumidor visa a sua completa efetividade.


2 CRIME QUANTO A EXECUÇÃO DE SERVIÇOS PERIGOSOS

São considerados crimes quanto a execução de serviços perigosos pelo Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
Art. 65. Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de autoridade competente.
Pena: Detenção de seis meses a dois anos e multa.
Parágrafo único. As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à lesão corporal e à morte.

Ao tipificar o crime quanto à execução de serviços perigosos, o legislador veio preencher a suposta contradição que alguns doutrinadores, como Rizzatto Nunes (2004, p.140), relatam nos arts. 8º, 9º e 10, que compõem a Secção I, os quais guardam uma ligação entre si no que se diz respeito ao grau de nocividade permitido.

O douto doutrinador relata que os analisando mais detidamente, perceber-se-á uma contradição nos termos postos em tais normas e que gera certa dificuldade de solução. Aduz ainda que da leitura dos três artigos percebe-se a contradição exatamente pelo permissivo do art. 9º, posto que o CDC aceita que haja produtos e serviços que sejam potencialmente nocivos. Enquanto o art. 8º diz que não haverá nocividade (exceto a previsível[4]) e o art. 10 proíbe os produtos e serviços altamente nocivos, porém, o art. 9º permite a venda dos não tão altamente nocivos.

Ao relatar que o legislador preenche esta suposta contradição decorre dos ensinamentos que o professor José Geral Brito Filomeno, no CDC Comentado pelos Autores do Anteprojeto (2004, p.695), trás através da sucinta explanação que demonstra completamente o sentido de tal fato típico existir em nosso ordenamento, in verbis:

Aqui também o que se pune, à evidência, não é o simples fato de alguém proporcionar serviços que apresentem certo grau de periculosidade, haja vista que, realisticamente, muitos deles assim se apresentem, bastando figurar-se como exemplo a dedetização, desratização, ou mesmo o espargimento de hortas caseiras ou plantas ornamentais com defensivos agrícolas, sem falar-se de grandes extensões com plantações de vários produtos agrícolas que se destinarão ao consumo da população.
O que se pune, isto sim, e dentro das diretrizes atrás traçadas, (...), contrariando as determina e regras impostas pelas autoridades competentes. (Grifo nosso).

Conforme o mesmo doutrinador destaca-se no direito comparado anglo-americano e alemão o sentido de partir-se da premissa realista que algum risco é admissível como normal, mas desde que advertido o consumidor pelo fornecedor e a obediência deste às prescrições legais, guardadas as características próprias de cada serviço.[5]

Conforme o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin, em Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (pág.23), deve-se ressaltar que não se trata de mera licença, embora esta já possa trazer, em si mesma, características e modo de execução para o serviço. Cuida-se de regulamentação propriamente dita, seja por decreto, seja por outro ato administrativo regulamentar.

Resta-se relatar que este crime pode ser classificado como de delito formal e de perigo abstrato, no sentido que se exige um resultado, tendo por valor ou objeto jurídico a proteção da saúde e segurança de um número indeterminado de pessoas.

Destaca-se também que é uma norma penal em branco, posto que requer complementação de “determinações de autoridades competentes”, que irão regular especificações a serem atendidas na execução de serviços já consagrados por si como perigosos.

Judicioso acrescentar a colocação de João Batista de Almeida, in text:
“A realização do tipo penal requer a prática de duas condutas conjuntas, a saber, executar serviço perigoso e contrariar determinação de autoridade competente. Trata-se de norma penal em branco, que deve ser complementada por regulamentação acerca da execução de serviços perigosos”. (ALMEIDA apud BENJAMIN, Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor, p.25).

Destarte que o delito consiste no fornecimento de serviço sem o conteúdo, formas e cautelas exigidas pela autoridade competente, seja através de atos administrativos gerais, seja mediante atos individualizados, seja, finalmente, por exigência legal.

2.1. O concurso material do parágrafo único do art.65

De acordo com o professor Guilherme de Souza Nucci, em Manual de Direito Penal (2005, p.427), pode-se conceituar como concurso de crimes como sendo: “a prática de várias infrações penais por um só agente ou por um grupo de autores atuando em conjunto”. E, de acordo com o mesmo doutrinador e na mesma obra, pode-se conceituar como concurso material, in litera:

Quando o agente, mediante uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, deve ser punido pela soma das penas privativas de liberdade em que haja incorrido, porque se adota o sistema da acumulação material. A acumulação material significa que a materialização de mais de um resultado típico implica na punição por todos eles, somando-se as penas. É que se dá no concurso material (art. 69, CP). Entretanto, o sistema que impõe a acumulação (soma) de penas também está presente em outras hipóteses, quando expressamente recomendada a sua utilização pela lei. (Grifo nosso).

Na óptica do ilustre professor José Geraldo Brito Filomeno, no CDC Comentado (2004, p.696), trata-se de uma novidade em matéria de crime de perigo comum, posto que, embora seja um crime formal ou mera conduta uma vez que decorre da atividade empresarial, incorre também na cumulação de penas e não mero agravamento da pena pelo resultado lesivo.

É de suma importância discorrer que se trata de crime preterdoloso que igualmente preside no disposto pelo art. 258 do Código Penal e que trata das formas qualificadoras dos crimes de perigo comum[6].

Em consonância com o direito penal, o parágrafo único do art. 65 do CDC expressamente prevê a soma das penas no caso de resultado de morte ou lesão corporal, àquelas cominadas para a simples omissão.

Tal atitude ocorre devido, conforme o douto José Geraldo Brito Filomeno, a conduta dolosa na ação de executar os mencionados serviços já notoriamente perigosos, circunstância esta inquestionável e já de pleno conhecimento do agente que, mesmo assim, desempenha tais serviços contrariando as normas de segurança e assumindo todos os resultados que são mais do que previsíveis.


3 CRIMES DE PUBLICIDADE

O Código de Defesa do Consumidor tipificou como crimes de publicidade:
Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:
Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.
§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.
§ 2º Se o crime é culposo;
Pena Detenção de um a seis meses ou multa.
Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva:
Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.
Parágrafo único. (Vetado).
Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança:
Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa:
Parágrafo único. (Vetado).
Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e científicos que dão base à publicidade:
Pena - Detenção de um a seis meses ou multa.

Para melhor discorrer sobre o assunto ora exposto, prioriza-se inicialmente por atentar ao sentido axiológico da palavra publicidade, para que assim, possibilite uma maior compreensão da publicidade lícita, desencadeando a capacidade para discernir sobre a publicidade enganosa, a publicidade abusiva, a publicidade regida em outros regramentos e, por fim, omissão na organização de dados que dão base a publicidade.


3.1. Publicidade em geral

Para entender a extensão da palavra publicidade, pode-se citar a expressão do ilustre Chacrinha utilizava: “Quem não se comunica, se trumbica”. Esta expressão, popularmente conhecida e divulgada pelo apresentador Abelardo Barbosa, demonstra fidedignamente a finalidade da publicidade.

Numa visão científica, pode-se aduzir que a publicidade, de acordo com Rizzatto Nunes na obra supracitada (2004, p.420), é um meio de aproximação do consumidor ao produto e serviço.

É de suma importância destacar que as palavras publicidade e propaganda possuem o mesmo sentido, pois, de acordo com o dicionário Aurélio, a propaganda visa à propagação de idéias, princípios e conhecimentos, e a publicidade é uma qualidade daquilo que é público. Bem como, nosso ordenamento jurídico não faz distinção quanto ao uso das duas palavras.

Contudo, em linhas gerais, deve-se relatar que não se coaduna com a produção, elemento este que o professor Rizzatto Nunes demonstra em sua obra (2004, p.421), pois a razão da produção existir se funda em algum produto ou serviço que se pretenda mostrar e/ou vender.


3.2. Publicidade lícita

A publicidade lícita vem regulada pelo Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária – CBAP, de 5 de maio de 1980, sendo expresso no corpo de seu texto a exigibilidade que todos (anunciantes, agências de publicidade, veículos de publicação, entre outros) devam atender as normas que este estabelece.

De acordo com o art.18, a, do CBAP, pode-se relatar que o anúncio corresponde a qualquer espécie de publicidade, seja qual for o meio que a veicule. Assim, equivale a anúncio desde a embalagem, ou rótulo, como comercial apresentado em rede televisiva.

Em face desta possibilidade ampla de divulgar o produto/serviço, o mesmo dispositivo legal (art. 18, c) traz como consumidor toda pessoa que possa ser atingida pelo anúncio, seja como destinatário ou público intermediário.

Por isso, que o anúncio deve ser honesto e verdadeiro, pois, de acordo com o art. 23 do CBAP deve ser realizado de forma a não abusar da confiança do consumidor, não explorando sua falta de experiência ou conhecimento, nem se beneficiar de sua credulidade, bem como, tenha por base dados da realidade (como descrição, preço e forma de pagamento, garantia, entre outros).

Complementando este sentido, o Código de Defesa do Consumidor prevê nos arts. 30, 31 e 35 normatiza nos seguintes termos:
Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.
Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:
I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;
II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;
III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.
Desta forma, procura-se salvaguardar a informação, como forma de segurança e amplo acesso aos novos serviços e produtos que se apresentam no mercado.


3.3. A publicidade regida em outros regramentos

É de fácil constatação que a regulamentação da publicidade com o CBAP em 1980 decorre da necessidade em coordenar este elemento – a publicidade - que se liga muito intimamente com a atividade comercial.

Assim, ressalta sobre a regulamentação da publicidade José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.697) que apesar de algumas leis esparsas já preverem a punição para a publicidade enganosa, como, por exemplo, no que diz respeito a lançamento de incorporação de imóveis (art. 65 da Lei nº. 4.591/64), loteamentos (art. 55, III, da Lei nº. 6.766/79), ou ainda as “infrações contra economia popular” (art. 3º, VII da Lei nº. 1.521/51), nosso ordenamento carecia de dispositivos claros.

Pontualmente, apresenta-se dentre várias tentativas feitas no passado no sentido de instituírem tipos penais específicos e bem definidos para que a publicidade enganosa ou abusiva, como artifício ou meio fraudulento para a obtenção de determinada vantagem ilícita, fossem repudiada como o estelionato (art. 171, caput do Código Penal) e a fraude de comércio (art. 175 do Código Penal).

Deve-se demonstrar algumas fundamentos antes do Código de Defesa do Consumidor regular e tipificar a publicidade enganosa e abusiva, bem como, ressaltar a valorosa criação da Lei nº. 8.137/90 que veio complementar as disposições do CDC nesta parte.


3.3.1. Estelionato

Dispõe o Código Penal sobre o estelionato, in legis:
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Possui íntima relação com a publicidade enganosa/abusiva ao relacionar com os elementos objetivos do tipo, os quais, de acordo com o professor Guilherme de Souza Nucci em Manual de Direito Penal (2005, p.701), in litteratim;

Há várias formas de consentimento de estelionato, prevendo-se a genérica do caput. Obter vantagem (benefício, ganho ou lucro) indevida induzindo ou mantendo alguém em erro. Significa conseguir um benefício ou um lucro ilícito em razão do engano provocado na vítima. Esta colabora com o agente sem perceber que está se despojado de seus pertences. Induzir quer dizer incutir ou persuadir e manter significa fazer permanecer ou conservar. Portanto, a obtenção da vantagem indevida deve-se ao fato de o agente conduzir o ofendido ao engano ou quando deixa que a vítima permaneça na situação de erro na qual se envolveu sozinha. É possível, pois, que o autor do estelionato provoque a situação de engano ou apenas dela se aproveite. De qualquer modo, comete a conduta proibida. Os métodos para colocar alguém em erro são fornecidas pelo tipo penal: artifício (astúcias, esperteza, embora na forma de armadilha, cilada ou estratagema) ou outro meio de fraudulento (trata-se de interpretação analógica, ou seja, após ter mencionado duas modalidades de meios enganosos, o tipo penal faz referência a qualquer outro semelhante ao artifício e ao ardil, que possa, igualmente, ludibriar a vítima). (Grifo nosso).

Conforme o douto Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra O Direito Penal do Consumidor a ineficácia do dispositivo decorre de dois pontos: o primeiro é que o direito penal não reconhecia a existência do consumidor; e o segundo decorre da finalidade dos dispositivos penais, que visão, basicamente, a proteção da saúde, liberdade e patrimônio sobre a forma de pressão nos conflitos privados, não ensejando o ressarcimento que muitos consumidores da época desejavam e não conseguiam.


3.3.2. Fraude no comércio

Dispõe o Código Penal sobre o crime de frade no comércio, in legis:
Art. 175 - Enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou consumidor:
I - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada;
II - entregando uma mercadoria por outra:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Conforme o dispositivo apresenta e sobre o ensinamento do professor Guilherme de Souza Nucci na sua obra Manual de Direito Penal (2005, p.709) observa-se que o sujeito ativo restringe-se ao comerciante, não se admitindo outra ocasião como nas relações particulares.

É de suma importância destacar que o dispositivo é o que mais se aproxima com as necessidades das relações de consumo, pois possui como sujeito passivo, de acordo com Nucci (2005, p.709), o consumidor ou a pessoa que adquire o produto.

Bem como, deve-se destacar os elementos objetivos do tipo que relaciona-se com os crimes de publicidade:
Enganar (induzir em erro, disfarçar ou esconder), no exercício de atividade comercial, o adquirente ou o consumidor, vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada (inciso I), ou entregando uma mercadoria por outra (inciso II). Trata este tipo penal de crime de estelionato próprio do comerciante. A pena é de detenção, de seis a dois anos. (Grifo nosso) (NUCCI, Manual de Direito Penal, 2005, p.710).

Como se pode observar, a fraude no comércio não conseguia efetivamente proteger os consumidores, pois restringia a compra de produtos e em face do objeto material, de acordo Nucci (2005, p.710), mercadoria falsificada, deteriorada ou substituída.

Em face a disposição do CDC e da Lei nº. 8.137/90 existe alguns doutrinadores que entendem como revogado o dispositivo penal, na visão de Guilherme de Souza Nucci, in litteratim: “Embora parte da doutrina entenda que o art. 175, I, foi revogado pelo art. 7º, III, da Lei nº. 8.137/90 (Crimes contra as relações de consumo), cremos que ele continua em vigor”. (NUCCI, Manual de Direito Penal, 2005, p.710).

3.3.3. Lei de Crime contra a Economia Popular – Lei nº. 1.521/51

Ressalta José Geraldo Brito Filomeno no Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto (2004, p.698) a importância que possui para a época a criação desta lei para a proteção da população contra alguns atos contra o consumo.

É de suma importância destacar o art.2º, IX desta lei, porque estabelece dentro do ordenamento os primeiros critérios de proteção do consumidor[7], in legis:
Art. 2º. São crimes desta natureza:
IX - obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos ("bola de neve", "cadeias", "pichardismo" e quaisquer outros equivalentes);
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, de dois mil a cinqüenta mil cruzeiros.

No âmbito da publicidade, José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.699) relata que esta lei deve ser mencionada, posto que foi com a inserção do inciso VII do artigo 3º que propiciou alguns termos de moldes a transformar-se em um dispositivo mais aberto e abrangente, e não apenas relativo a valores e ações, in lex:
Art. 3º. São também crimes desta natureza:
VII - dar indicações ou fazer afirmações falsas [ou enganosa] em prospectos ou anúncios, para fim de substituição, compra ou venda de títulos, ações ou quotas;
Pena - detenção, de 2 (dois) anos a 10 (dez) anos, e multa, de vinte mil a cem mil cruzeiros.

Conforme este professor, este dispositivo foi, sem dúvida, uma enganosa e oportuna tentativa, mas que não chegou a ser levada adiante.

3.3.4. Lei de Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e contra as Relações de Consumo – Lei nº. 8.137/90

Após o período em que o ordenamento não possuía uma regulamentação completa, ou seja, antes da criação do Código de Defesa do Consumidor, a fase de carência absoluta de criminalização de oferta e publicidade enganosa e abusiva, passou-se à abundância de normas.

Quanto a publicidade, destaca-se o inciso VII do art. 7º, desta lei, in legis:
Art. 7° Constitui crime contra as relações de consumo:
VII - induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária;

Destaca-se a observação que o professor José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.705) aduz que o referido tipo também não se confunde com os previstos pelo Código do Consumidor, notadamente os arts. 66 a 68, uma vez que estes independem de qualquer resultado lesivo, ou mesmo do induzimento do consumidor em erro, bastando a veiculação da publicidade ou oferta enganosa ou abusiva.

Outro apontamento que se deve ressaltar, de acordo com o professor Filomeno (2004, p.705), é que esta nova lei – a Lei nº. 8.137/90 – transformou em meio caminho entre a simples consideração de infração penal formal ou de mera conduta – critério adotado pelo CDC – e as figuras do estelionato e suas formas, ou mesmo falsidade ideológica, nas quais se exige um efetivo resultado danoso à vitima.

É de suma importância relatar que o verbo induzir quer dizer capaz de levar o consumidor a comportar-se de maneira errônea ou lesiva, em decorrência de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se (o agente) de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária (FILOMENO, 2004, P.706).

Pondera-se acrescentar que esta norma visa resgatar a idéia do art. 184 do CP, ou seja, relacionando a publicidade enganosa como forma de “concorrência desleal”, sendo este como uma forma de induzimento em erro (FILOMENO, 2004, P.706).

Desta forma, certeiramente pode-se afirmar que o dispositivo – art. 7º, VII da Lei nº. 8.137/90 – está para o delito de estelionato, assim como os do Código do Consumidor estão para a figura de crime contra a economia popular tratada pelo inciso IX do art. 2º da Lei nº. 1.521/51, visto que a mera tentativa de obterem-se ganhos ilícitos em detrimento do povo ou número indeterminado de pessoas já configura a infração, independentemente de sua efetiva obtenção (FILOMENO, 2004, P.706).


3.4. Publicidade enganosa


O ordenamento jurídico pátrio, tal qual como inúmeros países, adotou pela criminalização da publicidade/propaganda/oferta enganosa e abusiva, ao passo que, sendo considerado pelo professor José Geraldo Brito Filomeno, decorrente de um dos mais danosos e reprováveis delitos contra as relações de consumo.

Mesmo em face da ponderação trazida pelo douto José Geraldo Brito Filomeno no CDC Comentado (2004, p.698) do professor Paulo José da Costa Júnior, que o legislador não possui capacidade de prever todas as hipóteses que irão apresentar-se no futuro, obrigando a lançar hipóteses mais flexíveis, para assim abarcar todas as hipóteses, encontra-se disposto nos art. 37, §§ 1º e 3º do CDC, sobre a publicidade enganosa:
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
§ 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.
§ 3° Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.

Do texto legal, pode-se concluir que o efeito da publicidade enganosa é induzir o consumidor a acreditar em alguma coisa que não corresponde à realidade do produto ou serviço. Destaca-se ainda que, a publicidade enganosa pode ser usada como efeito chamariz, o qual Rizzatto Nunes relata como sendo umaelata como sendo duto ou serviço. Destaca-se ainda que, a publicidade enganosa pode ser usada como efeito chamariz, o qual maneira enganosa de atrair o consumidor, para que este, uma vez estando no estabelecimento acabe comprando algo.

É de suma importância destacar que para aferição da enganosidade não é necessário que o consumidor seja aquele real, pois, conforme disciplina a CBAP o consumidor é todo aquele que tem potencial em ser atingido. Assim, o anúncio enganoso é antes mesmo de atingir qualquer consumidor em concreto; bastando ter sido veiculado.

Complementando esta posição, José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.711), ressalta que mesmo por se tratar de delito que se materialize pela mensagem publicitária ou oferta, como sendo um delito instantâneo e de perigo, este manifesta sua potencialidade de dano à saúde, vida, segurança, e economia de um sem-número de receptores-alvos das mensagens veiculadas pelos mais variados meios de comunicação.

Quanto a publicidade enganosa por omissão, deve-se ressaltar que o texto legal traz como prospecto finalístico a essencialidade da informação no anuncio. O professor Rizzatto Nunes relata esta posição de maneira sapientíssima, in verbis:

Em suma, tudo aquilo que, apesar de ser essencial, já faz parte do conhecimento regular do consumidor não tem necessidade de ser mencionado. A contrario sensu, sempre que o dado for essencial, mas por algum motivo não for conhecido do consumidor, por ser novo ou por divergir do que este pensa como uso normal, deve ser informado. E, também, é essencial o elemento cuja omissão acaba por influenciar a decisão do consumidor para adquirir o produto ou o serviço.

E mais: tem de ser considerado dado essencial tudo aquilo que a lei determinar que o anúncio publicitário deve conter.

Como se pode observar, na posição do douto professor a falta das informações que o CBAP – honesto e verdadeiro – geram por si a publicidade enganosa.

José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.712) aduz quanto ao efetivo prejuízo, in litteratim:
No caso de ter havido efetivo prejuízo em decorrência de publicidade falsa ou enganosa, entendemos haver concurso de material de delitos, no caso como o estelionato, exatamente porque o que se visa é à coibição primordial da fraude publicitária, que coloca em risco a harmonia das relações de consumo, filosofia que, aliás, preside todos os dispositivos do mencionado Código.

E, com efeito, em acórdão do Supremo Tribunal Federal, em sede do Recurso Extraordinário nº. 41.199-DF, 2ª Turma, tendo como relator o ministro Luiz Gallotti, entendeu-se que um delito só é absorvido por outro no caso da subsidiariedade implícita, quando um tipo menos grave funciona como elementar ou qualificador de outro.

Como no caso então julgado – delito de falsidade conjugado à obtenção de vantagem ilícita – isso não ocorreria e o agente foi condenado tanto pelo primeiro como por estelionato, em concurso material, sendo essa igualmente a opinião do saudoso Heleno Cláudio Fragoso.

Deve-se ressaltar que se admite, na visão do professor José Geral Brito Filomeno (2004, p. 713), a tentativa, mas tão-somente quando a afirmação for falsa ou enganosa ou então a oferta, e não no caso de omissão, for produzida e não veiculada por circunstâncias alheias à vontade do responsável.

Em relação ao sujeito ativo, Rizzatto Nunes (2004, p.478), indica a responsabilidade solidária entre todos aqueles que participam da produção do anúncio e de sua veiculação, em face a expressa previsão do CDC: “ Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo” (Parágrafo único do ar.7º).

Numa posição diferente, José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.714), destaca que o anunciante/fornecedor – que conhece perfeitamente as condições do produto fabricado ou do serviço executado é sujeito ativo. Relata-se a existência de uma falsa posição divergente, pois gera inicialmente que para este doutrinador o não conhecimento de que a publicidade é enganosa excluiria o anunciante.

Mas, Rizzato Nunes (2004, p.479), indiretamente afirma esta posição, mesmo destacando em linhas iniciais que o fornecedor-anunciante é sempre responsável pelos danos que seu anúncio causar, sendo que, no seu caos particular, ainda responde por inserção de cláusula contratual ou sua nulificação em função do anúncio. Assim, a agência responde solidariamente com o anunciante, independentemente do tipo de contrato que com ele tenha estabelecido. Contudo, a falsa divergência exclui-se quando este doutrinador relata as seguintes exceções que geram a desresponsabilização da agência:
a) Não está objetivamente colocada no anúncio em si; e
b) Depende da ação real, concreta e posterior do fornecedor-anunciante, de maneira que a agência tenha participado como mera produtora de uma informação encomendada.

É de suma importância relatar que, de acordo com Rizzatto Nunes (2004, p.480), o veículo possui responsabilidade solidária com o anunciante e a agência. Bem como, este detém a capacidade de negar a inserir em seu meio anúncio que entenda ser enganoso.

Possui também força para impedir e de supressão da publicidade enganosa tanto o órgão administrativo, o CONAR, como o Poder Judiciário, uma vez acionado – individual ou coletivamente – poderá determinar a supressão tanto do anúncio veiculado, como da campanha.

3.5. Publicidade abusiva

O Código de Defesa do Consumidor trata da publicidade abusiva no art. 37, §2º, in legis:
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

José Geraldo Brito Filomeno aduz em sua obra de forma maestrina sobre a importância da criminalização da publicidade abusiva pelo Código de Defesa do Consumidor, in litteratim:
No campo penal, além dos tipos já analisados nos itens anteriores, ver-se-á que, no que diz respeito aos abusos da publicidade, procurou-se não apenas assegurarem-se as normas de Direito Material que definem a publicidade/oferta enganosa ou então abusiva, como também incorporarem-se ao ordenamento jurídico, em definitivo, normas penais efetivas frustradas nesse sentido, e que tinham ora uma objetividade jurídica diversa (por exemplo, a concorrência livre e leal e não direitos e interesses do consumidor), ora uma maneira indireta de inserir tais normas, como se verá no passo seguinte. (FILOMENO, Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 2004, p.698).

Esta preocupação decorre, na visão de Rizzatto Nunes (2004, p.487), em face que a publicidade abusiva não tem necessariamente relação direta com o produto ou serviço oferecido, mas sim com os efeitos da propaganda que possam causar algum mal ou constrangimento ao consumidor.

Pode-se assim concluir que, num mesmo anúncio pode conter além da publicidade enganosa a abusiva, posto que o produto/serviço precisa unicamente não corresponder com o que é verdadeiro e que preencha o conteúdo proibido por abusividade.

Dispõe sobre o conteúdo abusivo na obra de José Geraldo Brito Filomeno que:
Do decreto [Decreto nº. 57.690, de 1º de fevereiro de 1966] – Art. 17. ‘A Agência de Propaganda, o Veículo de Divulgação e o Publicitário em geral, sem prejuízo de outros deveres e proibições previstos neste Regulamento, ficam sujeitos, no que couber, aos seguintes preceitos, genericamente ditados pelo Código de Ética dos Profissionais da Propaganda a que se refere o art. 17, da Lei nº. 4.680, de 18 de julho de 1965’.
Observe-se, nesse sentido, que os incs. I e II falam, em última análise, de publicidade abusiva (I) e publicidade enganosa (II), dispondo que: ‘I – Não é permitido – a) publicar textos ou ilustrações que atentem contra a ordem pública, a moral e os bons costumes; b) divulgar informações confidenciais relativas a negócios ou planos de Clientes-Anunciantes; c) reproduzir temas publicitários, axiomas, marcas, músicas, ilustrações, proprietários ou autores; d) difamar concorrentes e depreciar seus méritos técnicos; e) atribuir defeitos ou falhas a mercadorias, produtos ou serviços concorrentes; f) contratar propaganda em condições antieconômicas ou que importem em concorrência desleal; g) utilizar pressão econômica, com o ânimo de influenciar os Veículos de Divulgação a alterarem tratamento, decisões e condições especiais para a propaganda. (FILOMENO, Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 2004, p.715).

Por isso, na visão de Rizzatto Nunes (2004, p.487), a publicidade comercial não pode de maneira alguma agir de forma discriminatória. Visto que, para caracterizar a natureza abusiva do anúncio não é necessário que ocorra de fato um dano real, bastando unicamente um perigo, já que a abusividade deve ser analisada de acordo com a potencialidade do anúncio em causar um mal.

Pode-se aferir tal entendimento em face do art. 17 do CBAP, in legis:
Artigo 17 - Ao aferir a conformidade de uma campanha ou anúncio aos termos deste Código, o teste primordial deve ser o impacto provável do anúncio, como um todo, sobre aqueles que irão vê-lo ou ouvi-lo. A partir dessa análise global é que se examinará detalhadamente cada parte do conteúdo visual, verbal ou oral do anúncio, bem como a natureza do meio utilizado para sua veiculação.

Destaca-se o entendimento do douto professor Rizzatto Nunes, in litteratim:
(...) não importa se a abusividade advém de parte do anúncio ou de sua projeção global sobre o público. Não interessa também saber se o teor potencial do dano a ser causado está só no aspecto visual ou apenas no oral ou no escrito. O que vale é o resultado do impacto sobre o consumidor (aliás, o resultado potencial; nem precisa ser real).

Se por qualquer dos aspectos considerados isoladamente (visual, oral, verbal etc.) ou se pelo contexto global insinuar-se a abusividade, o anúncio já estará caracterizado como abusivo. (NUNES, Curso de Direito do Consumidor, 2004, p.493).

Quanto ao sujeito ativo da publicidade abusiva ocorre da mesma forma que a publicidade enganosa, ou seja, existe a solidariedade tanto do anunciante com a agência e com o veículo de comunicação. Bem como, o meio de supressão e impedimento da publicidade pelo CONAR e Poder Judiciário se repete.

É de suma importância relatar que o CDC ainda dispôs um meio menos gravoso, que é a contrapropaganda, para que os anunciantes da publicidade enganosa ou abusiva por meio desta viessem se retratar e reduzir o dano provocado à sociedade, em contraposição ao desabafo que o professor José Geraldo Brito Filomeno apresenta quanto a efetiva punição nos casos ora analisados, in verbis:
Logo, conclui, o princípio de intervenção mínima não pode ser alegado contra essa nova incriminação; prova disso é que jurisprudência do Supremo Tribunal em mil raras ocasiões tem apenado um determinado estelionato segundo o vigente Código Penal cometido mediante uma publicidade, mencionando como ‘avis rara’ a sentença de 19 de junho de 1991, em que se consideraram por estelionato agentes que realizaram uma campanha de propaganda para atrair subscritores de participação em uma sociedade, com falsa promessa de oferecer vantagens na verdade inexistentes. (FILOMENO, Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 2004, p.708).

Conforme Rizzatto Nunes aduz em sua obra (2004, p.499), deve-se concordar com a visão do professor José Geraldo, pois a publicidade abusiva causa dano aos consumidores mesmo depois de cessada sua veiculação, uma vez que passa a fazer parte da memória das pessoas.

3.6. A omissão na organização de dados que dão base à publicidade

O dispositivo art. 68 e 69 visa transformar em efetivo as obrigações estabelecidas pela parte material do Código do Consumidor.

Complementa-se esta idéia, de acordo com o professor José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.730), o que se apresenta com o art. 36, parágrafo único do CDC, in lex: “ "stado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir ao erro o juiz ou perito" (2005, p.10008Art. 36 - A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”".

Pondera-se tal dispositivo posto que caso o consumidor precise ajuizar qualquer ação o Poder Judiciário terá meios hábeis de aquilatar sobre a tendenciosidade ou não de determinada publicidade, ou os órgãos administrativos incumbidos de seu controle. (FILOMENO, 2004, p.730).

Ressalta ainda o douto professor Filomeno (2004, p.731) que o dispositivo do art. 38 do CDC [8] é meio complementar a este fato, comprovando assim, que o sujeito ativo deste crime é o fornecedor/anunciante, posto que este é o ser que possui a obrigação de organizar e manter a guarda de tais dados fáticos.

É de suma importância aduzir que se classifica como um delito omissivo por excelência, haja visto o núcleo do dispositivo, conforme José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.731), bem como, seu elemento subjetivo é o dolo e quanto ao concurso com outros crimes, é possível na visão do mesmo doutrinador com o delito do art. 347 do CP [9].

4 CRIMES DE FALTA DE AUTORIZAÇÃO

Encontra-se disposto no art.70 do CDC sobre o crime falta de autorização, in lex: “Art. 70. Empregar na reparação de produtos, peça ou componentes de reposição usados, sem autorização do consumidor. Pena: Detenção de três meses a um ano e multa.”.

Pode-se, de acordo com o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.27), observar que para o CDC, a regra é que, em todos os consertos de produtos só podem ser empregadas peças novas. Sendo assim, a exceção o uso de peças usadas e, por isso mesmo, precisa de autorização expressa do consumidor.

Desta forma, conforme o professor José Gerado Brito Filomeno (2004, p.733), este dispositivo legal advém da parte material/administrativa do Código de Consumo, o art. 21[10], ensejando assim, através de sanções administrativas e penais, o efetivo cumprimento.
É de suma importância transcrever os ensinamentos do Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.27), ao tratar sobre esta prática ilícita em face do dever de consertar decorrente da responsabilidade por vício do produto ou serviço, in litteratim:

É prática comum no mercado brasileiro de reparo de bens de consumo, mesmo em assistência técnicas ditas ‘autorizadas’, a utilização de peças e componentes usados e recondicionados. Até ai não há nada de mais. Os problemas decorrem do fato de que os consumidores acabam pagando pelas peças e componentes como se fossem novos fossem. Ou, então, são informados a posteriori, valendo, aí, a tática do fato consumado. ‘Trata-se da indústria permanente dos consertos, em que peças ou componentes são trocados por outros, também usados, não raro em estado de conservação pior que aqueles substituídos. Oficinas idôneas de reparos de automóveis e de eletrodomésticos praticam o delito, com habitualidade.

É de suma ressaltar que:
Além disso, o que se tem em mira não é propriamente o fato de utilizar-se o prestador de serviços de reparação de determinado bem de peças ou componentes usados ou também comumente chamados de ‘recondicionados’.

O que se visa punir, isto sim, é a troca de peças usadas por outras também usadas, sem o consentimento do consumidor, com evidente prejuízo para ele e ganho para o reparador. (FILOMENO, Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 2004, p.734).

Por isso, possui como objetividade jurídica, de acordo com o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.28), proteção à relação econômica, ensejando assim, na proteção à informação plena do consumidor sobre as condições em que se dá o fornecimento do serviço.

Devendo assim destacar a colocação do professor José Geraldo Brito Filomeno:
O que não se pode admitir, contudo, é que o consumidor venha a ser enganado pagando por peças novas quando na realidade não o são, preservando-se aqui a lisura que deve presidir as relações de consumo e o patrimônio do consumidor.

O núcleo do tipo em pauta, pois, é definido pelo verbo ‘empregar’ peças ou componentes usados, complementando-se sua normatividade pela expressão ‘sem autorização do consumidor’, já que poderá autorizar seu emprego, mas de forma expressa. (FILOMENO, 2004, p.735).

Em face desta posição o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p. 30) assevera que o crime é formal, de perigo de abstraio, posto que:

Não há necessidade, para a consumação, de dano efetivo para o consumidor. A peça usada pode, inclusive, ser melhor que a nova (hipótese de remota caracterização) e, ainda assim, presente estará a violação do dispositivo. Basta o inconformismo do consumidor com o seu emprego à sua revelia. Sequer se exige que o fornecedor, após empregar peça usada, cobre se nova fosse.

(...) Não se exige, portanto, nem dano concreto ao consumidor, nem efetiva fraude. Basta a vontade consciente de empregar peças usadas sem consulta do consumidor. Se o legislador desejasse ver presente o requisito da fraude, de resto importante no estelionato, assim teria dito (‘mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento’).

Destarte, pondera o professor Filomeno (2004, p.736), admite-se a tentativa, pois, pode-se eventualmente perceber a tempo a troca de peças ditas novas, mas que em realidade são usadas ou no máximo recondicionadas.

Por isso, temos como sujeito ativo qualquer prestador de serviços, como sujeito passivo qualquer consumidor e como elemento subjetivo o dolo.

5 CRIME DE COBRANÇA VEXATÓRIA

O direito de propriedade é uma garantia constitucional (art.5º, XII), que permite a legislação infraconstitucional, garanta o direito do credor em cobrar seu crédito. Desta forma, na parte dispositiva do Código de Defesa do Consumidor apresenta-se o art.42, o que reza o seguinte:
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

O legislador pátrio ao codificar tal ato advém para que seja evitado o exemplo ora apresentado pelo professor José Geraldo Brito Filmoneno, in litteratim:
A experiência também nos demonstrou que, além de práticas pouco recomendáveis, como a que vigorou durante um certo tempo na capital de São Paulo com famosos ‘vermelhinhos’ ou ‘cenourinhas’ que infernizavam a vida dos inadimplentes nos pagamentos de alguns carnês, fazendo um verdadeiro carnaval à porta de suas casas, inclusive com auto-falantes e até bandas de música . (FILOMENO, Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 2004, p.737).

Desta forma, conforme Rizzatto Nunes (2004, p.537), a cobrança de uma dívida é ação regular do credor em relação ao devedor. O CDC não impede que assim ocorra, mas sim a chamada cobrança abusiva.

A cobrança abusiva vem disposta no art. 71 da Lei nº. 8.078/90, in legis:
Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer.
Pena Detenção de três meses a um ano e multa.

Destarte, de acordo com o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.31), a cobrança de dívidas do no âmbito do consumo deve respeitar as exigências do art. 42 (civil) e art. 71 (penal), a qual gerará ao fornecedor que cobrar dívidas em desconformidade com estes parâmetros responsabilização civil, administrativa e penal.

Deve-se, então, apreender do dispositivo do art. 71 do CDC, de acordo com Rizzatto Nunes (2004, p.540), sobre o tipo do objeto que:
a) A única ameaça que o fornecedor-credor poderá fazer é a de processar ou de negativar o devedor[11];
b) A coação é em si o exercício de uma ação (coação) irregular contra a vontade do consumidor inadimplente, sendo expressamente vedado pelo dispositivo qualquer tipo;
c) O constrangimento físico ou moral é vedado, bem como, todas as práticas que expõem o consumidor inadimplente a riscos a sua saúde e integridade física, ou de seus familiares, e/ou lhes causem dor no aspecto moral;
d) Mesmo que aparentemente sejam tomadas por sinônimas as expressões “afirmação falsa”, “incorreta” e “enganosa”, o que o legislador pátrio pretendia é impedir que por qualquer artifício o consumidor seja iludido quanto aos elementos apresentados na ação de cobrança e na prática de cobrança em si;
e) A ação que importe em expor o consumidor inadimplente sem qualquer conexão com o ato de cobrar torna a cobrança abusiva;
f) O dispositivo legal ao destacar que é vedada a interferência com o trabalho, descanso ou lazer, visa salvaguardar que se deixem avisos de cobrança com colegas ou superiores de seu inadimplemento.

Pondera-se acrescentar que objeto jurídico do crime ora realçado é a liberdade, honra, bem como a incolumidade física do consumidor. Deveras afirmar que em se tratando dos elementos subjetivos do crime ocorre dolo específico, posto que visa à cobrança de dívidas contraídas em decorrência da relação de consumo.(FILOMENO, 2004,p.738)

Complementa o douto Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.33), que o sujeito ativo é aquele que efetiva a cobrança, mesmo este sendo ou não o fornecedor primitivo do produto ou serviço. E o sujeito passivo, de acordo com José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.739), é qualquer consumidor que se veja nas contingências do tipo do objeto.


6 CRIME DE ACESSO E OMISSÃO NA CORREÇÃO DE DADOS

O direito a liberdade de informação é guardado como clausula pétrea no art.5º, XIV e XXXIII, in legis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

Este dispositivo legal dentro do âmbito do Direito do Consumidor foi tutelado no art. 43 do CDC, in verbis:
Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
§ 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos.
§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.
§ 3° O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas.
§ 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público.
§ 5° Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores.

Visando efetivar os dispositivos ora mencionados, surgem os crimes de acesso e omissão na correção de dados, in lex:
Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros:
Pena: Detenção de seis meses a um ano ou multa.
Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata:
Pena: Detenção de um a seis meses ou multa.

Ressalta do Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (p.36) que:
Os arquivos de consumo são uma novidade da sociedade de massa, baseada no anonimato do consumidor e na utilização massiva de crédito. Mas se os arquivos de consumo por um lado facilitaram enormemente o crédito ao consumidor, por outro trouxeram uma invasão de sua privacidade e, com ela, inúmeros abusos. (...) O art. 72 é, sem dúvida, a contraface penal do art. 43, caput, e de seu parágrafo primeiro. Ambos asseguram o "direito de acesso" do consumidor aos arquivos de consumo.

Complementando tal assertiva o douto José Geraldo Brito Filomeno aduz que:
Não é justo que o nome do outrora mau consumidor-pagador fique constando dos cadastros do SPC sem negativação e, o que é pior, não possa saber o que realmente dali conste contra si para a devida correção mediante a providência administrativa ou judicial competente.
Daí por que tipo de que ora se cuida do art. 72 do Código do Consumidor utiliza os verbos ‘impedir ‘ ou ‘dificultar’ o acesso do consumidor àquelas informações dos SPCs ou outros bancos de dados com a mesma finalidade de resguardar os fornecedores quanto a prejuízos futuros ou ‘calotes’ dos maus pagadores. (FILOMENO, Código de Defesa do Consumidor Comentado pelo Autores do Anteprojeto, 2004, p.747).

Da mesma forma que o acesso é protegido pelo art. 72, tem-se no art. 73 a defesa quanto a omissão na correção de dados incorretos, pois, de acordo com o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (p.39), o direito de acesso aos arquivos de consumo é instrumental. Ou seja, não é um fim em si mesmo. Seu objetivo é permitir que o consumidor, uma vez que tenha conhecimento das informações que sobre ele estão arquivadas, possa providenciar sua retificação.

Destarte, José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.748) aduz que o núcleo do tipo em questão é expresso pelo verbo deixar (comportamento omissivo) de corrigir dados inexatos a respeito de qualquer consumidor em bancos de dados, tratando-se, por conseguinte, de delito formal e de natureza instantânea com efeito permanente, ou seja, sua consumação se protrai no tempo até que cesse a permanência nos registros, arquivos, fitas gravadas ou qualquer outro meio de armazenamento de informações.

Deveras importante destacar que o dispositivo ora analisado, mais especificamente o art. 43, §4º, vem complementar ao remédio constitucional habeas data previsto no art. 5º, LXXII. (FILOMENO, 2004, p.749).

Pondera-se afirmar a classificação que este dois crimes possuem, realçando, de acordo com o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (p.36), que a objetividade jurídica ampara-se, primordialmente, a relação de consumo econômica, na medida em que informações incorretas ou proibidas podem dificultar o crédito do consumidor.

Relata ainda o douto Ministro (p.37) que o sujeito ativo é todo aquele que impede ou dificulta o acesso do consumidor às informações arquivadas. Já o sujeito passivo, como sucede em todos os crimes de consumo, é sempre a coletividade de consumidores e também, neste caso, o consumidor individual vítima da perturbação.

7 CRIME DE FALTA DE GARANTIA

O legislador pátrio ao produzir o Código de Defesa do Consumidor observou um grande problema que existia na época que era com a baixa qualidade dos produtos devido a produção em massa e a falta de uma devida garantia aos consumidores que estes produtos não iriam quebrar num prazo sem proporcionar uma utilização suficiente.

Nesta mesma posição o douto José Geraldo Brito Filomeno relata que:
O termo de garantia, geralmente conferido pelos fabricantes de produtos ou bens de consumo duráveis, tem dupla finalidade: 1º) zelar pelo bom nome da própria empresa-fornecedora; 2º) reparar eventuais defeitos, sabendo-se que na produção em massa alguns exemplares fabricados fatalmente apresentarão algum defeito, dentro de um certo tempo de uso ainda inicial, por maior que seja o controle de qualidade de que disponha.

Do mesmo modo que ocorre com a maioria dos crimes previstos no CDC, observa o professor José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.751), que a razão da tipificação do crime de omissão na entrega de termos de garantia decorre do art. 50 e seu parágrafo único, in lex:
Art. 50. A garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito.
Parágrafo único. O termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.

Manuel Pedro Pimentel apud Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (p.41) aduz que:
A obrigação de fornecer ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com especificação clara do seu conteúdo, transformando tal obrigação em dever legal, capaz de tipificar sua falta como crime omissivo, é providência altamente elogiável.

Desta forma, o dispositivo legal criminaliza na seguinte forma: “Art. 74. Deixar de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com especificação clara de seu conteúdo. Pena: Detenção de um a seis meses ou multa.”.

Assevera o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin na sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (p.41) que o art. 74, evidentemente, não se aplica à garantia legal, já que esta independe de termo expresso (art. 24). O crime pressupõe a existência de garantia contratual. Inexistindo esta, descabível (ou não exigível) o termo de garantia, sendo, pois, impossível a realização do delito. O CDC não impõe um dever de oferta de garantia contratual; mas se esta for prestada, deverá ser idônea e entregue no ato do fornecimento, sob pena de configurar-se conduta criminosa.

Por isso, José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.752) proclama que a razão de tal dispositivo decorre de que o termo de garantia visa evitar dissabores futuros ao consumidor, e já que o próprio fornecedor, mediante declaração unilateral de vontade, se compromete a reparar ou mesmo trocar o bem que apresente certo defeito de fabricação ou vício oculto, podendo mesmo, no primeiro caso retrorreferido, constituir-se em sério risco à incolumidade física daquele mesmo consumidor, nada mais natural que proceda corretamente às instruções que devem ser pro aquele seguida.

Deve-se ainda relatar que o tipo possui como objetividade jurídica visa assegurar que o consumidor receberá informações adequadas sobre o conteúdo da garantia, o sujeito ativo é aquele que deixou de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente e sujeito passivo a coletividade. (BENJAMIN, p.42)

__________________________________________________________________
[1] Deve-se ressaltar que este artigo foi revogado pela Lei nº. 8.137/90, que trata sobre a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo.
[2] É de suma importância ressaltar um importante apontamento que o Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin fez em sua obra Crimes de Consumo no Código de Defesa do Consumidor (pág.2) que quase todos os tipos penais do CDC estão relacionados com o tema da informação do consumidor, desde os delitos de oferta não publicitária enganosa (art. 66), de oferta publicitária enganosa (art. 67), da oferta publicitária abusiva (arts. 67 e 68), de cobrança irregular de dívidas (art. 71), de perturbação do acesso do consumidor aos arquivos de consumo (art. 72), até o de não entrega do termo de garantia adequadamente preenchido (art. 74).
[3] Rizzatto Nunes, em sua obra Curso de Direito do Consumidor (2004, p.150), destaca o recall como um meio, pelo qual a norma protecionista pretende que o fornecedor impeça ou procure impedir, ainda que tardiamente, que o consumidor sofra algum dano ou perda em função de vício que o produto ou o serviço tenham apresentado após sua comercialização. É de suma importância aduzir que o art. 10, §2º, do CDC trás o fornecedor como inteiro responsável pelos gastos pelo recall, haja vista que este dispositivo possui uma interpretação extensiva, como relata o grande professor Rizzatto.
[4] Rizzatto Nunes, em sua obra Curso de Direito do Consumidor (2004, p.141), ao aduzir sobre ao risco normal e previsível relata que a lei se refere à normalidade e previsibilidade do consumidor em relação ao uso e funcionamento rotineiro do produto ou serviço. Além disso, destaca-se que a regra legal, ao referir a expectativa do consumidor, está supondo o grau de conhecimento-padrão existente no mercado. Ao passo que estes aspectos normativos relativos ao consumidor e seu conhecimento padrão do uso e funcionamento regular dos produtos e serviços devem vir das informações necessárias e adequadas constantes no caput do artigo.
[5] No direito pátrio, o art. 8º reza o dever de informar do fornecedor. Rizzato Nunes, na obra supra-citada (2004, p.142), relata que este aspecto está relacionado ao risco à saúde e segurança do consumidor, e tal obrigatoriedade está intimamente relacionada ao núcleo da norma. Ou seja, o fornecedor deve informar sobre os riscos que não são normais e previsíveis em decorrência da natureza e fruição dos produtos e dos serviços, seja novo ou de conhecimento popular.
[6] O professor Guilherme de Souza Nucci, em Manual de Direito Penal (2005, p.830), destaca que no caso do art. 258, prevê-se, para os delitos dolosos de perigo comum, se houver resultado qualificador consistente em lesão corporal grave, a aplicação da pena aumentada da metade (logo, o mínimo e o máximo têm aumentado de metade). Quando houver morte, a pena será dobrada (o mesmo se faz quanto ao mínimo e ao máximo). Havendo, no entanto, nos delitos culposos, lesão corporal, a pena é aumentada da metade (lança-se o aumento na terceira fase); resultando morte, aplica-se a pena do homicídio culposo (detenção de um a três anos), aumentada de um terço.
[7] Ressalte-se que o termo consumidor ainda não era usualmente estabelecido pelo ordenamento, mas mesmo assim ainda demonstra os primeiros passos para a defesa da sociedade como um todo, como consumidores.
[8] Art. 38. O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina.
[9] Sendo melhor esclarecido a luz dos elementos objetivos do tipo relatados pelo douto Guilherme de Souza Nucci (2005, p.1008), in litteratim: “Inovar (introduzir uma novidade capaz de gerar engano) artificiosamente (usar um recurso enganoso, malícia ou ardil), na pendência de processo civil e as sindicâncias), o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir ao erro o juiz ou perito”.
[10] Reza o mencionado artigo: “Art. 21. No fornecimento de serviços que tenham por objetivo a reparação de qualquer produto considerar-se-á implícita a obrigação do fornecedor de empregar componentes de reposição originais adequados e novos, ou que mantenham as especificações técnicas do fabricante, salvo, quanto a estes últimos, autorização em contrário do consumidor”.
[11] José Geraldo Brito Filomeno (2004, p.738) faz a seguinte ponderação: “Casos Práticos – Acórdão encontrado na Revista dos Tribunais nº. 687, ps. 296-298, decidiu acertadamente e dentro do enfoque ora discutido que ‘a comunicação ao serviço de proteção ao crédito, mantido pela Associação Comercial, e, consequentemente, o registro do nome do devedor inadimplente no cadastro da mesma, não caracteriza a violação à norma do art.71 do Código de Defesa do Consumidor, posto que, permitindo a lei a instalação dos denominados serviços de proteção ao crédito, como também o uso, equiparando-os a serviço público, sua utilização pelo credor não pode ser tida como abusiva, logo, ausente a possibilidade jurídica do pedido’.
‘Com efeito’, lê-se ainda no corpo do aresto citado, ‘o mesmo Código de forma a balancear as relações entre vendedor e consumidor, notadamente como forma de proteger o comerciante do mau pagador, permite que formem bancos de dados sobre os consumidores (art.43), equiparando os serviços de proteção ao crédito e congêneres a entidades de caráter público (parágrafo único)’ ”.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Direito Constitucional: Constituição

1. Conceito Material de Constituição:

Constituição é um conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição da competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais.

Não há Estado sem Constituição, visto que toda sociedade politicamente organizada contém uma estrutura mínima, por mais rudimentar que seja. Todos os países, em todos os tempos, a possuíram. Como acrescentou Lassalle em Bonavides: ”O que, portanto é realmente peculiar à época moderna não são as Constituições materiais, mas as Constituições escritas, as folhas de papel.”

Em suma, a Constituição, em seu aspecto material, diz respeito ao conteúdo, mas tão-somente ao conteúdo das determinações mais importantes, únicas merecedoras, segundo o entendimento dominante, de serem designadas rigorosamente como matéria constitucional.

2. Conceito Formal de Constituição:

Designa-se exclusivamente por haver sido introduzida na Constituição, enxertada no seu corpo normativo e não porque se refira aos elementos básicos ou institucionais da organização política. Sendo obra do legislador ordinário, não entraram, todavia no corpo da Constituição e dela formalmente não fazem parte.

O contrário também ocorre. Com efeito, disposições de teor aparentemente constitucional penetram por sua vez na Constituição, mas apenas de modo impróprio, formalmente, e não materialmente, visto que não se reportam aos pontos cardeais da existência política, a saber, à forma de Estado, à natureza do regime, à moldura e competência do poder, à defesa, conservação e exercício da liberdade.

Mas uma vez postas na Constituição, tais normas – repetimos – embora não sejam materialmente constitucionais, somente poderão suprimir-se ao alterar-se mediante um processo diferente, mais solene e complicado (conforme a prescrição constitucional ).

Diz Kelsen, enunciando o conceito formal de Constituição; “Fala-se de Constituição em sentido formal quando se faz a distinção entre as leis ordinárias e aquelas outras que exigem certos requisitos especiais para sua criação e reforma.” Decorre assim do conceito formal de Constituição, segundo Kelsen, a distinção entre legislação ordinária e a legislação constitucional.

3. Constituições Rígidas e Constituições Flexíveis:

Constituições rígidas são as que não podem ser modificadas da mesma maneira que as leis ordinárias, estas demandam um processo de reforma mais complicado e solene. Constituições flexíveis são aquelas que não exigem nenhum requisito especial de reforma. Podem, por seguinte, ser emendadas ou revistas pelo mesmo processo que se emprega para fazer ou revogar a lei ordinária. A Constituição flexível é obtida através de um processo de expressão da vontade parlamentar por maioria simples.

Erro, portanto, é cuidar que toda Constituição costumeira é flexível e toda Constituição escrita é rígida.


4. Constituições Costumeiras e Constituições Escritas:

Inexistem Constituições totalmente costumeiras, como o da França antes da Revolução Francesa, como disse Barthélemy, “Uma complexa, massa de costumes, usos e decisões jurídicas”.
Parcialmente costumeiras, tal como a da Inglaterra, cujas leis abrangem o direito estatutário (statute law), o direito casuísticos ou jurisprudencial (case law), o costume, mormente o de natureza parlamentar (parliamentary law) e as convenções constitucionais (constitutional conventions). Por outra parte deparam-se-nos Constituições complementadas em sua aplicação pelo costume.

Segundo Mario González: “pode dizer-se que Constituições escritas são aquelas que foram promulgadas pelo órgão competente; constituições não escritas ou consuetudinárias aquelas que a prática ou costume sancionaram ou impuseram“.

Decorre, entre outros, das seguintes razões, historicamente comprovadas ou reconhecidas, conforme assinalam textualmente Esmein e Garcia Pelayo: a) a crença na superioridade da lei escrita sobre o costume; b) a imagem de que a Constituição simbolicamente renova com toda a solenidade o contrato social e, finalmente, c) o sentimento concebido, desde o século XVIII, de que não há melhor instrumento de educação política do que o texto de uma Constituição.

5. Constituições Codificadas e Constituições Legais:

Constituições codificadas são aquelas que se acham contidas inteiramente num só texto, com os seus princípios e disposições sistematicamente ordenados e articulados em títulos, capítulos e sessões formando em geral um único corpo de lei.

Possuem as seguintes partes: o Preâmbulo, a parte introdutória, a parte orgânica, a parte dogmática e uma parte de decisões gerais ou finais, acrescidas não raro de algumas disposições transitórias.

As Constituições legais são aquelas Constituições escritas que se apresentam esparsas ou fragmentadas em vários textos haja vista, a titulo ilustrativo, Constituição Francesa de 1875. Compreendida ela Leis Constitucionais, elaboradas em ocasiões distintas de atividade legislativa, como as leis de estabelecimento dos poderes públicos, de organização do Senado e de relações entre os poderes. Tomadas em conjunto passaram a ser designadas como a Constituição da Terceira Republica.

Com a expressão Constituição legal designa-se também uma Costituição escrita não formal.

6. Constituições Outorgadas, Constituições Pactuadas e Constituições Populares:

Constituição outorgada representa a limitação da autoridade do governante. Do ponto de vista jurídico, a constituição outorgada é ato unilateral de uma vontade política soberana – a do outorgante, mas do ponto de vista político, representa quase sempre uma inelutável concessão feita por aquela vontade ao poder popular ascendente, sendo, pois o produto de duas forças antagônicas que se medem em termos políticos de conservação ou tomada do poder. Essas duas forças em conflito dialético são o principio monárquico do absolutismo e o principio democrático do consentimento.

O Chefe de Estado, outorgando a Constituição, a ela se sujeita, juridicamente e politicamente, embora alguns pretendam posa ele depois no exercício da vontade soberana, que ficara latente, modificar a seu alvedrio a ordem constitucional outorgada. Temos como exemplo a Constituição imperial brasileira de 25 de março de 1824, outorgada por D. Pedro I.

As Constituições populares ou democráticas são aquelas que exprimem em toda a extensão o principio político e jurídico de que todo o governo deve apoiar-se no consentimento dos governados e traduzir a vontade soberana do povo.

7. Constituições Concisas e Constituições Prolixas:

As Constituições concisas tomam por igual à denominação de breves, sumárias, sucintas e básicas, ou passo que as Constituições prolixas aparecem ainda sob a designação de longas, amplas, extensas, desenvolvidas, largas, etc.

Uma Constituição é concisa quando abrange apenas princípios gerais ou enuncia regras básicas de organização e funcionamento do sistema jurídico estatal, deixando a parte de pormenorização a legislação complementar e orgânica.

As Constituições prolixas, cada vez mais numerosas, são em geral aquelas que trazem matéria por sua natureza alheia ao direito constitucional. Trata-se ora de minúcias e regulamentação, que melhor caberiam em leis complementares, ora de regras ou preceitos até então reputados pertencentes ao campo da legislação ordinária e não do direito constitucional, em cuja esfera entram apenas formalmente, por arbítrio do legislador constituinte, para auferir garantias que só a Constituição proporciona em toda a amplitude.









Bibliografia:
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, SP: Malheiros Editores, 2000.

Direito Penal: Princípio da Legalidade

“Art. 1º: Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”

Previsto também na Constituição Federal em seu artigo 5º, XXXIX, tem por finalidade servir como garantia política ao cidadão contra o arbítrio estatal. Este princípio da legalidade compreende dois princípios distintos: o da reserva legal e o da anterioridade.


I ) Princípio da reserva legal:

Podemos estudar o princípio da reserva legal sob dois aspectos:

a) Formal:

· Reserva absoluta da lei – Somente a lei emanada e aprovada pelo Poder Legislativo poderá criar tipos e impor penas. A medida provisória e a lei delegada não podem veicular matéria penal. A Constituição Federal veda a adoção destas medidas sobre matéria relativa a Direito Penal (art. 62, parágrafo 1º, inciso I, alínea “b” e art. 68, parágrafo 1º, inciso II).

· Taxatividade – Refere-se à necessidade da lei descrever o crime em todos os seus pormenores (detalhada e específica). A lei não pode conter expressões vagas e de sentido equívoco, pois dão ao juiz larga e perigosa margem de discricionariedade. Essa proibição não alcança os crimes culposos, pois seria impossível tipificar todas as condutas humanas. Por isso, os tipos culposos são denominados tipos abertos e os tipos dolosos são fechados.

· Vedação ao emprego da analogia – O princípio da reserva legal proíbe o emprego da analogia em matéria de norma penal incriminadora. Ou seja, é proibido o uso da analogia in malam partem, mas é aceito o uso da analogia in bonam partem, pois favorece o direito de liberdade ao réu.

b) Material:

Em um tipo penal não podem constar condutas positivas que não representam qualquer ameaça à sociedade. O exercício deste controle pressupõe a aplicação de três princípios:

· Adequação social – Não podem ser considerados fatos criminosos as condutas aprovadas pela coletividade. -> ATENÇÃO: O costume não revoga a lei, mesmo ainda que leve a norma penal ao desuso, não pode revogá-la (art. 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil);

· Insignificância – Aplica-se aos chamados “delitos de bagatela”. O tipo penal cuida do bem jurídico e da proteção do cidadão assim, se o delito for incapaz de ofender o bem jurídico, não haverá como enquadra-lo no tipo. Cumpre observar que se a infração for de menor potencial ofensivo, deve incidir a Lei n.º 9.099/95 – Lei dos Juizados Especiais Criminais;

· Alteridade – Não podem ser punidas condutas que não lesionem outras pessoas, por exemplo, tentativa de suicídio.



II ) Princípio da anterioridade:

A lei que descreve um crime deve ser anterior ao fato incriminado, sendo que a lei só poderá alcançar fatos anteriores para beneficiar o réu.




BIBLIOGRAFIA:
JESUS, Damásio. Curso do Professor Damásio à distância: Módulo I – Direito Penal. São Paulo, SP, 2004.

Direito Tributário: Fontes do Direito Tributário

1. FONTES DO DIREITO:

Por fontes do direito havemos de compreender os focos ejetores de regras jurídicas. O significado da expressão fontes do direito implica refletirmos sobre a circunstância de que regra jurídica alguma ingressa no sistema do direito positivo sem que seja introduzida por alguma norma.
Nos limites desta proposta, as fontes do direito serão os acontecimentos do mundo social, juridicizados por regras do sistema e credenciados para produzir normas jurídicas que introduzam no ordenamento outras normas. Tais ocorrências serão colhidas enquanto atos de enunciação.

Nos esquadros desse modelo, as fontes do direito positivo aparecerão como uma estrutura formada pela hierarquia de eventos previstos como conteúdo de normas, em que encontramos, no ápice, a assembléia constituinte, na condição de fonte superior e, abaixo, os demais núcleos produtores de regras, em disposição vertical que culmina nos focos singulares de que promanam os preceitos terminais do sistema.

Bastaria agora, para completar, imaginar a multiplicidade das normas “introduzidas”, igualmente ordenadas e classificadas pela referência aos respectivos veículos introdutores, e teremos o sistema do direito positivo, na plenitude de sua configuração de sentido.
É pela descrição normativa que o jurista entra em contacto com o fato da realidade social e com a conduta regulada, regressando à norma num movimento dialético incessante. Desse modo, um acontecimento da vida real-social será ensejador de eficácia jurídica se, e somente se, estiver previsto em norma válida do sistema “S”, que o descreve em sua hipótese (antecedente normativo), disciplinando o comportamento humano dele irradiado no seu conseqüente ou prescritor. E, para imprimir o caráter de uniformidade que toda a ciência reclama, dá-se o corte metodológico da norma fundamental, concebida artificialmente para fazer da atividade constituinte um factum juridicamente hábil para instaurar nova ordem de direito positivo.

Fortes nesses pressupostos não hesitaríamos em proclamar que o estudo das fontes do direito está voltado primordialmente para o exame dos fatos enquanto enunciação que fazem nascer regras jurídicas introdutora, advertindo desde logo que tais eventos só assumem essa condição por estarem previstos em outras normas jurídicas.

O que denominamos “fontes do direito” são fatos jurídicos criadores de normas: fatos sobre os quais incidem hipóteses fáticas, dando em resultado normas de certa hierarquia.

Tem sido o rumo trilhado pela doutrina no que respeita ao estudo das fontes como o próprio resultado da atividade dos vários órgãos legiferantes, falando em leis (sentido amplo), jurisprudência (acórdãos e sentenças judiciais), atos administrativos (em toda a gama de sua hierarquia) e até no costume.

E da sorte desse raciocínio participa a impugnação da dicotomia fontes formais/ fontes materiais. As primeiras são estudadas como fórmulas que a ordem jurídica estipula para introduzir regras no sistema, enquanto as últimas se ocupam dos fatos da realidade social que, descritos hipoteticamente nos supostos normativos, têm o condão de produzir novas proposições prescritivas para integrar o direito positivo.

Em obséquio à clareza das proposições científicas oferecemos agora, em súmula estrita, a seguinte conclusão: o estudo das chamadas fontes materiais do direito circunscreve-se ao exame do processo de enunciação dos fatos jurídicos, de tal modo que neste sentido a teoria dos fatos jurídicos é a teoria das fontes dogmáticas do direito. Paralelamente, as indagações relativas ao tema das fontes formais correspondem à teoria das normas jurídicas, mais precisamente daquelas que existem no ordenamento para o fim primordial de servir de veículo introdutório de outras regras jurídicas. Posto que este campo de investigação assume caráter de grande interesse e de indiscutível utilidade para o cientista, permitindo-lhe situar as unidades prescritivas nos respectivos patamares da estrutura piramidal, nada mais razoável do que compreender o porquê da insistência dos doutos em discorrer espaçosamente sobre o assunto.


2. FONTES DO DIREITO POSITIVO E FONTES DA CIÊNCIA DO DIREITO:

As fontes do direito positivo são as materiais. Para que tais eventos adquiram o predicado de fontes, mister se faz que encontrem qualificação em hipótese de normas válidas do sistema. Já por fontes da Ciência do Direito podemos, numa opção perfeitamente aceitável, congregar tudo aquilo que venha a servir para a boa compreensão do fenômeno jurídico, tomando como a linguagem prescritiva em que se verte o direito.


3. A DOUTRINA:

Chama-se de doutrina ao domínio das lições, ensinamentos e descrições explicativas do direito posto, elaboradas pelos mestres e pelos juristas especializados. Sua linguagem é eminentemente descritiva, reproduzindo, de forma elucidativa, o conteúdo e os mecanismos de articulação próprios do direito positivo.

A doutrina não é fonte do direito positivo. Seu discurso descritivo não altera a natureza prescritiva do direito. Ajuda a compreendê-lo, entretanto não o modifica. Nem será admissível concebê-la como fonte da Ciência do Direito, pois ela própria pretende ser científica. Quem faz doutrina quer construir um discurso científico, reescrevendo as estruturas prescritivas do sistema normativo.


4. INSTRUMENTOS INTRODUTÓRIOS DE NORMAS TRIBUTÁRIAS NO DIREITO BRASILEIRO – INSTRUMENTOS PRIMÁRIOS E SECUNDÁRIOS:

A lei e os estatutos normativos que têm vigor de lei são os únicos veículos credenciados a promover o ingresso de normas inaugurais no universo jurídico brasileiro, pelo que as designamos por “instrumentos primários”. Todos os demais diplomas regradores da conduta humana, no Brasil, têm sua juridicidade condicionada às disposições legais, quer emanem preceitos gerias e abstratos, quer individuais e concretos. São, por isso mesmo, considerados “instrumentos secundários” ou “derivados”, não apresentando, por si só, a força vinculante que é capaz de alterar as estruturas do mundo jurídico-positivo. Realizam os comandos que a lei autorizou e na precisa dimensão que lhes foi estipulada.

Sintetizemos, para assentar que os instrumentos introdutórios de normas se dividem em instrumentos primários – a lei na acepção lata – e instrumentos secundários ou derivados – os atos de hierarquia inferior à lei, como os decretos regulamentadores, as instruções ministeriais, as portarias, circulares, ordens de serviço etc.

5. INSTRUMENTOS PRIMÁRIOS:

I – A lei constitucional – Instrumento primeiro e soberano, que se sobrepõe aos demais veículos introdutórios de normas. Abriga, em grande parte, regras de estrutura, quer dizer, normas que prescrevem como outras devem ser produzidas, modificadas ou extintas. Igualmente, é o texto constitucional portador dos grandes princípios que servem de diretrizes supremas a orientar o exercício das competências impositivas, consagrado os postulados que imprimem certeza e segurança às pretensões tributárias do Estado e, em contrapartida, preservam e garantem os direitos individuais dos cidadãos. No Brasil, ocupa-se demoradamente da matéria tributária, o texto constitucional não núcleo jurídico adequado para a criação de tributos. Essa providência esdrúxula, entretanto, acabou acontecendo, pelo que se lê do art.8º, IV, da CF, assim escrito: “A assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei”. A ponderação sobre esses aspectos nos permite asseverar que, entre as interpretações jurídicas possíveis, uma delas há de reconhecer que, nesta hipótese, a Constituição de 1988 institui diretamente um tributo chamado contribuição confederativa.

II – A lei complementar – Com sua natureza ontológico-formal, isto é, matéria especialmente prevista na Constituição e quorum qualificado a que alude o art.69 da CF – maioria absoluta nas duas Casas do Congresso, cumpre hoje função institucional da mais alta importância para a estruturação da ordem jurídica brasileira. Para temas tributários, a Lei Básica de 1988 prescreveu muitas intervenções de legislação complementar, que vão desde a expedição de normas gerais (art.146, III) até a própria instituição de tributos, como no caso da competência residual da União (art.154,I), ou na hipótese de empréstimos compulsórios (art. 148,I e II), passando por uma série de assuntos dos mais variados matizes.

III – A lei ordinária – Pode ser editada tanto pela União como pelos Estados e Municípios, no delineado campo de suas competências constitucionais. Não há que se cogitar de supremacia da lei ordinária federal em relação à estadual e à municipal. Desfrutam do mesmo status jurídico, discerníveis apenas pelo âmbito da competência exercida. A lei ordinária é, inegavelmente, o item do processo legislativo mais apto a veicular preceitos relativos à regra-matriz dos tributos, assim no plano federal, que no estadual e no municipal. É o instrumento por excelência da imposição tributária. Mesmo nos casos em que a Constituição dá ao Executivo Federal a prerrogativa de manipular o sistema de alíquotas, como no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), tudo se faz dentro de limites que a lei especifica. Cabe ainda à lei ordinária preceituar os deveres instrumentais ou formais, impropriamente conhecidos como obrigações acessórias, que propiciam a operatividade prática e funcional do tributo.

IV – A lei delegada – É mais uma exceção à regra genérica pela qual a atividade que consiste em editar diplomas legais pertence, com exclusividade, ao Poder Legislativo. Elas são elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação do Congresso Nacional (art. 68 da CF), que se manifestará mediante resolução, especificando o conteúdo e os termos de seu exercício (art.68, §2º). Esta mesma resolução, se assim o entenderem os parlamentares, poderá estabelecer que o Presidente ofereça o projeto, que será apreciado em votação única, vedada qualquer emenda (art.68, §3º). Entre as matérias que não podem ser delegadas estão as reservadas à lei complementar, do que decorre o impedimento de utilizar-se aquela fórmula do processo legislativo para a instituição do empréstimo compulsório (art.148 da CF), ou para a criação de impostos, pela União, em sua faixa de competência residual (art.154, I), e todos os demais assuntos tributários para os quais o Diploma Fundamental indique a lei complementar como estatuto adequado.

V – As medidas provisórias – Sob o ângulo político, diríamos que vieram compensar a União pelo desaparecimento do decreto-lei. Bem que subordinadas aos pressupostos de relevância e urgência, são expedidas pelo Presidente da República e irradiam, de pronto, todos os efeitos para os quais estão preordenadas. Ao editá-las, com força de lei, o presidente submetê-las-á de imediato à apreciação do Congresso Nacional. Por isso mesmo entra em vigor imediatamente quando for publicada. Abriga uma contradição de ordem semântica com o prazo inicial de vigência fixado em tempo posterior. A estrutura lógica da frase normativa não comporta interpretação sintática de outra ordem, reclamando que as duas proposições conjuntas se verifiquem no mundo dos fatos sociais, para que a iniciativa possa ser desencadeada. Quanto ao mais, as questões não se simplificam. Os §§ 3º e 7º daquele mesmo art.62 exibem, de modo ostensivo, a existência do direito do Congresso Nacional rejeitar, por conduta omissiva, a medida provisória comunicada pelo Presidente. Poderá empreendê-lo por comissão, isto é, legislando no sentido de aprová-la (total ou parcialmente) ou de rejeitá-la; como terá, também, a autorização de ignorá-la, sobre ela não legislando no período de cento e vinte dias, comportamento que manifestará, categoricamente, sua omissão. A EC 32/01 procurou estimular a apreciação da medida, mesmo que para rejeitá-la, prescrevendo a entrada no regime de urgência e o sobrestamento de todas as deliberações parlamentares, em ambas as Casa, se, decorridos quarenta e cinco dias da publicação. O § 10º, ao vedar a reedição de medida provisória na mesma sessão legislativa, inscreve as duas possibilidades: (I) rejeição e (II) perda da eficácia por decurso de prazo. O prazo de sessenta dias para a vigência da medida provisória (art.62, §3º) será prorrogado por igual período, uma única vez sempre que o correspondente processo legislativo de apuração não tenha sido encerrado. De fato, o art. 60, §5º, estatui que “A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”.

· O §3º do art.62 da CF – A análise parece propor que, rejeitada a medida provisória, esta há de perder sua eficácia, a contar da publicação (efeito ex tunc). Quem se ativer à leitura pura e simples do texto dificilmente deixará de entender que cabe ao Poder Legislativo regrar as situações jurídicas remanescentes, sempre que a proposta for rejeitada. A exegese dotada de maior racionalidade aponta para o caso de acolhimento da medida provisória (total ou parcialmente) pelo Congresso. Aqui, sim, há não só campo fecundo para o desempenho da função legislativa, como necessidade de imediatas providências de teor interativo. Com efeito, ao converter-se em lei, perde a medida seu caráter provisório e ingressa, definitivamente, na ordem jurídica, suscitando adaptações imprescindíveis para que se mantenham a harmonia e o bom funcionamento do direito positivo. Bem se vê que a medida provisória, levada a sério, representará perigoso instrumento para o Poder Executivo, na proporção em que lhe caiba responder pela composição dos danos emergentes, ocorridos no intervalo que vai da edição até a rejeição expressa ou tácita pelo Legislativo.

· O processo de aprovação e o veículo em que se converte a medida provisória – Comunicadas por mensagem da Presidência da República, as medidas provisórias serão apreciadas primeiro pela Câmera dos Deputados (§8º) e depois pelo Senado, cabendo a uma comissão mista de deputados e de senadores examiná-las, preliminarmente, quanto ao atendimento de seus pressupostos constitucionais, mediante parecer (§§ 5º e 9º).

· As relações jurídico-tributárias e a utilização de medidas provisórias – A medida provisória tem servido de instrumento para uma série de providência jurídico-políticas, nos mais variados campos. Eis que a Emenda n.32 veio a restabelecer o equilíbrio do sistema, dizendo por outra forma, mas deixando suficientemente claro, que a medida provisória não poderá instituir ou majorar tributos. A disposição, contida no art.62, §2º, abre apenas exceção para os impostos extraordinários, uma vez que os previstos no art.153, I, II, IV e V, são criados por lei e podem ter suas alíquotas majoradas mediante singelo decreto do Presidente, nos termos em que a lei o admitir. Penso que nos horizontes do direito constitucional tributário, do modo como está posto, a medida cumprirá a função de mera iniciativa do Chefe do Executivo, no sentido de desencadear o processo de elaboração da lei em que será convertido o projeto aprovado.

VI – Decreto-legislativo – É o assunto expressivo das competências exclusivas do Congresso Nacional e está no nível da lei ordinária. Aprovado por maioria simples, não tem sanção, sendo promulgada pelo Presidente do Congresso, que o manda publicar. Adquire grande relevância no direito brasileiro como veículo que introduz o conteúdo dos tratados e das convenções internacionais no sistema normativo. Esclareça-se que os tratados e as convenções internacionais, bem como os convênios interestaduais, não são portadores de força vinculante.

VII – Resoluções – Ainda que não sejam leis em sentido estrito, revestem-se do status jurídico próprio da lei ordinária e, atuando em setores que a Constituição lhes demarca, são também instrumentos primários de introdução de normas tributárias.
especificando o conte[estara. a Repiste em editar diplomas legais pertence, com exclusividader produzidas, modificadas ou extin

6. INSTRUMENTOS SECUNDÁRIOS:

Os instrumentos secundários são todos os atos normativos que estão subordinados à lei. Não obrigam os particulares e, quanto aos funcionários públicos, devem-lhe obediência não propriamente em vista de seu conteúdo, mas por obra da lei que determina sejam observados os mandamentos superiores da Administração.

I – Decreto regulamentar – É ato de competência privativa dos chefes dos poderes executivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Roque Carrazza define o regulamento como um ato normativo, unilateral, inerente à função administrativa que especificando os mandamentos de uma lei não auto-aplicável, cria normas jurídicas gerais.

II – Instruções ministeriais – Estão previstas no art.85, II da CF e competem aos Ministros de Estado para o fim de promover a execução das leis, decretos e regulamentos que digam respeito às atividades de sua pasta.

III – Circulares – Igualmente, encerram normas jurídicas de caráter infralegal e visam à ordenação uniforme do serviço administrativo.

IV – Portarias – Por seu turno, consubstanciam regras gerais ou individuais que o superior edita para serem observadas por seus subalternos. Ocorrem em todos os degraus da escala hierárquica, desde os ministérios até as mais simples repartições do serviço público. Prestam-se não só para veicular comandos administrativos gerais e especiais, como também para designar funcionários para o exercício de funções menores, abrir sindicâncias e inaugurar procedimentos administrativos.

V – Ordens de serviço – São autorizações ou estipulações concretas, mas para um determinado tipo de serviço a ser desempenhado por um ou mais agentes, especialmente credenciados para tal. Seu âmbito é bem delimitado, circunscrevendo-se ao serviço e aos funcionários que o prestam.

VI – Outros atos normativos estabelecidos pelas autoridades administrativas – No direito tributário brasileiro encontramos a figura esdrúxula dos pareceres normativos, na esfera federal, que consistem em manifestações do entendimento de agentes especializados, sobre a matéria tributária submetida à sua apreciação, e que adquirem foros normativos, vinculando a interpretação entre funcionários, no que concerne ao tópico debatido.

7. CONCEITO DE LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA PARA O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL:

A expressão “legislação tributária” compreende as leis, tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes (art.96 do CTN).

Insere o legislador, no mesmo quadro, indiscriminadamente atos normativos inaugurais, como as leis, ao lado dos tratados e convenções internacionais, que valem na ordem jurídica interna se e somente se acolhidos no conteúdo de decreto legislativo, como tivemos oportunidade de ver.

Bibliografia: Paulo de Barros Carvalho. Curso de Direito Tributário. 17ª ed. 2005.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Direito Tributário: Tributo

ACEPÇÕES DO VOCÁBULO “TRIBUTO”:

O vocábulo ‘tributo’ experimenta nada menos do que seis significações diversas.
- “Tributo” como quantia em dinheiro;
- “Tributo” como prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo;
- “Tributo” como direito subjetivo de que é titular o sujeito ativo;
- “Tributo” como sinônimo de relação jurídica tributária;
- “Tributo” como norma jurídica tributária;
- “Tributo” como norma, fato e relação jurídica.

A DEFINIÇÃO DO ART. 3º DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL:

Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Tributo é uma prestação pecuniária compulsória – Prestação pecuniária compulsória quer dizer o comportamento obrigatório de uma prestação em dinheiro, afastando-se, de plano, qualquer cogitação inerente às prestações voluntárias. Por decorrência, independem da vontade do sujeito passivo, que deve efetiva-la, ainda que contra seu interesse;

Em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir – Ao agregar a cláusula “ou cujo valor nela se possa exprimir” isso ampliou exageradamente o âmbito das prestações tributárias. Note-se que quase todos os bens são suscetíveis de avaliação pecuniária, principalmente o trabalho humano que ganharia a possibilidade jurídica de formar o substrato de relação de natureza fiscal;

Que não constitua sanção de ato ilícito – Determina-se a feição de licitude para o fato que desencadeia o nascimento da obrigação tributária. Como são idênticos os vínculos (sanção e tributação) é pela associação ao fato que lhe deu origem que vamos conhecer a índole da relação;
Instituída em lei – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei, é o cânone da legalidade, inscrito peremptoriamente no art. 5º, II da CF. Ao mencionar instituída em lei, de certo que se pretendeu afastar as chamadas obrigações convencionais, que teriam fulcro, invariavelmente, numa convergência de vontades.

E cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada – Devemos entendê-la que atos importantes do procedimento de arrecadação tributária pertencem à classe dos vínculos, a fim de dar satisfação aos objetos consagrados no sistema legal.

TIPOLOGIA TRIBUTÁRIA NO BRASIL – O CRITÉRIO CONSTITUCIONAL PARA A DETERMINAÇÃO DA NATUREZA DO TRIBUTO:

Não é suficiente a descrição hipotética do fato jurídico tributário para que conheçamos a planta fundamental do tributo. Preceitua o constituinte brasileiro no art. 145, § 2º: As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos. E, mais adiante, no art. 154: A União poderá instituir: I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição.

Foi para este fim, qual seja, a imediata verificação da entidade, enquanto tributo, que o constituinte fez inserir a base de cálculo na compostura do tipo tributário. O cotejo entre as duas realidades tributárias denunciará, logo no primeiro instante, a exigência de um imposto, de uma taxa ou de uma contribuição de melhoria, aplicando-se, subsequentemente, às várias espécies de cada qual.

Tem-se como critério:
· Trata-se de diretriz constitucional, firmada num momento em que o legislador realiza o trabalho delicado de traçar a rígida discriminação de competências tributárias;
· Permite o reconhecimento da índole tributária, sem a necessidade de considerações retóricas e até alheias ao assunto.
Finalizemos para dizer que, no direito brasileiro, o tipo tributário se acha integrado pela associação lógica e harmônica da hipótese de incidência e da base de cálculo.

O ART. 4º DO CTN – DENOMINAÇÃO E DESTINO DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO:

O preceito traz duas contradições interessantes para a boa compreensão da matéria: são as circunstâncias nele consignadas como irrelevantes para influir na constituição íntima do tributo – a denominação e demais características formais adotadas pela lei; e a destinação do produto da sua arrecadação.

Manifesta o legislador, no inciso I, uma extraordinária lucidez, ao declarar que suas palavras não devem ser levadas ao pé da letra. O inciso II vem como um aviso providencial: o destino que se dê ao produto da arrecadação é irrelevante para caracterizar a natureza jurídica do tributo.

EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO:

A matéria vem tratada no art.148, I e II, com parágrafo único. A competência é exclusiva da pessoa política União e deverá ser exercida mediante lei complementar, em apenas duas hipóteses:
a) Para atender as despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência (I);
b) No caso de investimento público de caráter de urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, b (princípio da anterioridade) (II).

Nas duas eventualidades, a aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição (parágrafo único).

A índole tributária dos empréstimos compulsórios: satisfazem, plenamente, as cláusulas que compõem a redação do art.3º do CTN, indicando-o como um tributo, de nada importando o plus representado pela necessidade de restituição, ínsita ao conceito de “empréstimo”, porque bem sabemos que o nome atribuído à figura ou o destino que se dê ao produto da arrecadação nada acrescem à natureza jurídica do tributo (art. 4º, CTN).

O IMPOSTO COMO TRIBUTO NÃO-VINCULADO À ATUAÇÃO DO ESTADO:

Muitos critérios podem orientar uma classificação dos tributos em espécies. As clássicas, mais difundidas, vêm carregadas de fortes conotações extrajurídicas, principalmente econômicas.

Trata-se da classificação dos tributos em vinculados e não vinculados a uma atuação do Poder Público, didaticamente exposta por Geraldo Ataliba.

Toda vez que o binômio expressar um acontecimento que envolva atuação do Estado, estaremos diante de um tributo vinculado. Por exemplo: o Estado presta serviços de assistência médica; o Estado exercita o poder de polícia, autorizando a realização de um baile; o Estado presta serviço de abastecimento de águas etc. A vinculação pode ser direta, como nos casos mencionados, ou indireta, como na realização de uma obra pública que suscite valorização dos imóveis adjacentes.

Sempre que nos depararmos com a vinculação direta, imediata, teremos as taxas, ao passo que a vinculação indireta, mediata, indica a existência de uma contribuição de melhoria, consoante o último exemplo mencionado.

O interesse científico dessa classificação está no seu ponto de partida: o exame das unidades normativas, visualizadas na conjugação do suposto (hipótese de incidência), e da base de cálculo (que está na conseqüência da norma), mantendo plena harmonia com a diretriz constitucional que consagra a tipologia tributária no direito brasileiro. Convém aduzir, entretanto, que a acolhemos com o seguinte latitude: os tributos podem ser vinculados a uma atuação do Estado - taxas e contribuições de melhoria – e não-vinculados – impostos.

Sendo assim, podemos definir imposto como o tributo que tem por hipótese de incidência (confirmada pela base de cálculo) um fato alheio a qualquer atuação do Poder Público.
Art.16 – Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

Com efeito, debalde procuraremos na hipótese de incidência dos impostos uma participação do Estado dirigida ao contribuinte. A formulação lingüística o denuncia e a base de cálculo o comprova. É da índole do imposto, no nosso direito positivo, a inexistência de participação do Estado, desenvolvendo atuosidade atinente ao administrado.

Têm os impostos um regime jurídico-constitucional peculiar. A Carta Magna reparte competência legislativa para instituí-los entre as pessoas política de direito constitucional interno – União, Estado, Distrito Federal e Municípios. Fala-se, por isso, em competência privativa para a instituição dos impostos, que o constituinte enumerou, nominalmente, indicando a cada uma das pessoas políticas quais aqueles que lhe competia estabelecer. E deriva dessa repartição de competências legislativas a divisão dos impostos em função do conteúdo material que há de integrar o núcleo das respectivas hipóteses normativas. São eles:
· Impostos que gravam o comércio exterior – Atribuídos à União: imposto de importação e imposto de exportação;
· Impostos sobre o patrimônio e renda - Atribuídos à União: Imposto de renda, imposto sobre propriedade rural e Imposto sobre grandes fortunas. Atribuídos aos Estados e Distrito Federal: Imposto veicular. Atribuídos aos Municípios: Imposto sobre propriedade predial e territorial urbana;
· Imposto sobre a transmissão, circulação e produção - Atribuídos à União: Imposto sobre produtos industrializados e Imposto sobre Operação de Crédito. Atribuídos aos Estados e Distrito Federal: Imposto sobre transmissão in causa mortis e doação; e Imposto sobre circulação de mercadorias e prestações de serviços. Atribuídos ao Município: Imposto de transmissão inter vivos; e Imposto sobre serviços de qualquer natureza;
· Impostos extraordinários - Atribuídos à União na iminência ou no caso de guerra externa;
· Impostos previamente indeterminados - Atribuídos à União na proporção conhecida por residual de sua competência.

Dispondo a União, como de fato dispõe, da possibilidade extraordinária de instituir impostos, compreendidos ou não em sua competência tributária, entendemos, em homenagem ao rigor, que só cabe falar-se em competência privativa do ente federal, expressa pelos impostos mencionados nos incisos do art. 153, mais o art. 154, I da CF/88.

TAXAS COBRADAS PELA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS E PELO EXERCÍCIO REGULAR DO PODER DE POLÍCIA:

Taxas são tributos que se caracterizam por apresentarem, na hipótese da norma, a descrição de um fato revelador de uma atividade estatal, direta e especificamente dirigida ao contribuinte. Nisso diferem dos impostos, e a análise de sua base de cálculo deverá exibir, forçosamente, a medida da intensidade da participação do Estado.

O direito positivo vigente prevê duas espécies de taxas:
a) Taxas cobradas pela prestação de serviços públicos;
b) Taxas cobradas em razão do exercício do poder de polícia.

Em qualquer das hipóteses previstas para a instituição de taxas o caráter sinalagmático deste tributo haverá de mostrar-se à evidência.

CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA:

Permite a Constituição Federal que as pessoas políticas de direito constitucional interno – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – além dos impostos que lhe foram outorgados e das taxas previstas no art. 145, II, instituam contribuições de melhorias, arrecadadas dos proprietários de imóveis beneficiados por obras púbicas.

Convém esclarecer que, se as taxas pressupõem serviços públicos ou o exercício do poder de polícia, as contribuições de melhoria levam em conta a realização de obra pública que, uma vez concretizada, determine a valorização dos imóveis circunvizinhos. A efetivação da obra pública por si só não é suficiente. Impõe-se um fator exógeno que, acrescentado à atuação do Estado, complemente a descrição factual. E a valorização imobiliária nem sempre é corolário da realização de obras públicas.

Em comparação com as taxas, que também são tributos vinculados a uma atuação do Estado, as contribuições de melhoria se distinguem por dois pontos expressivos: pressupõe obra pública e não serviço público; e dependem de um fator intermediário, que é a valorização do bem imóvel. Daí dizer-se que a contribuição de melhoria é um tributo vinculado a uma atuação do Poder Público, porém indiretamente referido ao obrigado.

DAS CONTRIBUIÇÕES:

O legislador constituinte prescreve manifestamente que as contribuições são entidades tributárias, subordinando-se em tudo e por tudo às linhas definitórias do regime constitucional peculiar aos tributos.

No art. 149, §1º, conferem-se poderes aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para criarem contribuições, cobradas de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União.

A conclusão parece-nos irrefutável: as contribuições são tributos que, como tais, podem assumir a feição de impostos ou de taxas. Três, portanto, são as espécies de contribuição:
I - Social;
· Genéricas – São voltadas aos diversos setores compreendidos no conjunto da ordem social, como educação, habitação etc. (art.149, caput).
· De custeio - Destinado ao custeio social, compreendendo a saúde, previdência e assistência social (art. 149, caput, e §1º, conjugados com o art.195).
II - Interventiva;
III - Corporativa.

Tendo o constituinte empregado, como critério classificatório, a finalidade de cada uma delas, representada pela destinação legal do produto arrecadado.

Além das contribuições de competência da União, observa-se, também, no sistema constitucional tributário vigente, a possibilidade de essa espécie de tributo ser instituída pelos Municípios e Distrito Federal: trata-se da contribuição para o custeio de iluminação pública, a que se refere o art.149-A da Carta Magna, introduzida pela EC 39/02.


Fonte: CARVALHO, Paulo de Barros. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 17ªed. 2005.